“Horas Más” - o estado calamitoso da nossa Imprensa regional
“Horas Más” é uma magnifica obra de Gabriel Garcia Marques e conta a história de um pequeno vilarejo onde quase todas as manhãs são pregados anonimamente nas portas das casas, panfletos, denunciando a vida privada deste e daquele, nomeadamente casos de infidelidade, segredo de família e amores proibidos. A situação torna-se de tal maneira explosiva e lamacenta, que leva o povoado a uma espécie de Estado-de-sítio, com mortes, vinganças, e com aproveitamentos políticos pelo meio.
Deste modo, só espero que a nossa pequena comunidade insular não seja tomada por este género de contágio asqueroso, de gente a escarafunchar na vida privada de cada um, no intuito de alcançar sórdidos e repugnantes objetivos.
Mas, o mais grave e condenável, é haver certa Imprensa da região a indicar dicas e achegas nas suas páginas eletrónicas, com o objetivo patológico de guiarem os seus leitores em direção a este pantanal putrefato.
Digo isto, como também condeno o atual estado da nossa Imprensa escrita, onde a informação credivel, independente e objetiva, deu lugar a uma espécie de leilão jornalístico, onde a força política que promove mais encartes, mais iniciativas promocionais de propaganda, mais “chouriços” - como se diz na gíria jornalística - e aquela que desvia mais dinheiros públicos para os seus proprietários, é a força política que triunfa, que tem mais destaque, e aquela cujos líderes políticos mais aparecem com as suas cremalheiras sorridentes ao lado dos seus pseudosucessos em celulose.
E como a maioria das pessoas não estão treinadas nem preparadas para distinguir o que é jornalismo sério e o que é propaganda e manipulação, tornam-se sem o saber, vítimas e agentes teleguiados destes vendilhões de papel, nomeadamente no dia que irão meter o seu voto na urna.
É tempo de se dizer basta! De se acabar com esta sangria de dinheiro dos contribuintes a caírem diretamente nos bolsos insaciáveis dos patrões destes órgãos de propaganda. Já estamos fartos de ver jornais preocupados com o deputado que rasgou o papelinho; o videozinho que os apanhou na retoiça; aquele outro que mascou pastilha elástica; ou um outro que se excedeu numa noite de copos, situações censuráveis, é certo, mas cuja importância é infinitamente menor, do que os grandes casos de corrupção que abalam a nossa sociedade, como o desvio de milhões de euros dos contribuintes para grupos privados; contratos públicos mafiados; monopólios de rapina instituídos e protegidos; tachos na administração regional e municipal para satisfazer clientelas políticas; apartamentos onde são engendrados milhões de euros em faturas falsas; orçamentos participativos realizados para a propaganda e para beneficiar filhos e enteados; ajustes diretos de negócios públicos a sociedades amigas, em troca de favores monetários, tudo situações deliberadamente abafadas ou publicados envergonhadamente em páginas interiores que ninguém lê.
E ai daquele que se atreva a desmascará-los e criticá-los, pois é logo crucificado e achincalhado nas folhas dos respetivos jornais.
É este o estado calamitoso da nossa Imprensa regional, onde os jornalistas de uma forma muito subtil são amordaçados e manietados por estes poderes ocultos, e onde se promove a autocensura e o encobrimento.
Por isso, senhores deputados, parece que batemos no fundo! Vivemos “Horas Más”!
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